A jornalista foi premiada em 1º Lugar na categoria texto na etapa estadual da 11ª edição da premiação, que contou com mais de 80 trabalhos inscritos apenas no estado (Foto de Juliana Pesqueira/Amazônia Real).
Ao andar pelas ruas de Manaus, as contradições socioambientais chamavam a atenção de Nicoly Ambrosio em sua adolescência. Com 14 anos, a hoje jornalista graduada pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam), já documentava a cidade através da fotografia independente. Em setembro deste ano, Nicoly ganhou o primeiro lugar na categoria texto da etapa estadual da 11ª edição do Prêmio Sebrae de Jornalismo, que reconhece as melhores notícias veiculadas em diferentes canais da imprensa brasileira.
“Estilistas indígenas conquistam espaço na moda” , a reportagem vencedora, foi publicada no site da Amazônia Real em janeiro. O texto narra como os indígenas estão na contramão do mercado tradicional da moda ao elaborar peças a partir do conhecimento ancestral, aplicando o grafismo nas roupas, utilizando materiais sustentáveis e produzindo no tempo da natureza.
“Quis contar sobre a evolução do trabalho desses estilistas, à medida que ficaram mais conhecidos no cenário da moda nacional no último ano”, diz a jornalista sobre a reportagem premiada.
A etapa estadual da 11ª edição do Prêmio Sebrae de Jornalismo contou com mais de 80 trabalhos inscritos apenas no Amazonas, dos quais foram validados 36 trabalhos, que atenderam aos critérios do regulamento nas categorias Texto, Áudio, Foto e Vídeo. Ao todo, o Sebrae nacional recebeu 3.076 trabalhos enviados por profissionais e estudantes de jornalismo de todo o Brasil.
“Após a etapa estadual, os vencedores de cada categoria disputam a etapa regional, que, por sua vez, definirá os finalistas da etapa nacional. Ao final, os ganhadores nacionais de cada categoria principal ainda concorrem ao Grande Prêmio Sebrae de Jornalismo”, diz a organização.
O tema central do concurso deste ano foi “A contribuição dos pequenos negócios na transformação de realidades locais”. Os vencedores da etapa foram divulgados no dia 3 de setembro, na sede do Sebrae/AM. Além de Nicoly Ambrosio, da Amazônia Real, foram vencedores Daniela Branches, da Rede Amazônica; Mauricio Max, Band News Difusora FM; e Ricardo Oliveira, do Amazônia 360°.
O escopo das investigações jornalísticas de Nicoly tem sido a denúncia de violação de direitos humanos, conflitos em territórios de populações tradicionais e a comunidade LGBTQIAPN+. “Sou uma jovem repórter curiosa pelo mundo e pelas histórias que as pessoas querem me contar”, diz a repórter.
Em 2023, a jornalista Wérica Lima, da equipe da Amazônia Real , conquistou o segundo lugar na categoria texto da 10ª edição do Prêmio Sebrae de Jornalismo Amazonas com a reportagem “Como o mercado de trabalho exclui as pessoas trans” .
O trabalho de Nicoly Ambrosio, de 25 anos, já é reconhecido em premiações há quatro anos. Em 2020, recebeu o 1° Prêmio de Jornalismo Neusa Maria pela reportagem “Um vírus e duas guerras: “Na pandemia, a mulher está em casa à disposição do agressor”, diz feminista do Amazonas” . Em 2024, outra reportagem da profissional – “Manaus é palco da primeira ball indígena da Amazônia” -, foi finalista da terceira edição do Prêmio Megafone de Ativismo. Leia a íntegra da entrevista abaixo.
A jornalista Nicoly Ambrosio foi premiada pelo Sebrae (Foto realizada no Centro de Medicina Indígena por Juliana Pesqueira/Amazônia Real)
Amazônia Real – Parabéns pelo primeiro lugar no Prêmio Sebrae de Jornalismo! Como você se sentiu ao receber essa notícia?
Nicoly Ambrosio – Obrigada! Fiquei muito feliz e muito satisfeita em saber que o trabalho do jornalismo independente pode ecoar de forma positiva e pode até furar essas bolhas, principalmente quando se trata de pautar a narrativa dos povos indígenas, que é tão estigmatizada pela sociedade.
Amazônia Real – Como surgiu a pauta sobre os estilistas indígenas? O que te levou a produzir o texto?
Nicoly – Desde 2022, eu estou produzindo reportagens que falam da trajetória de estilistas indígenas na Amazônia, falando sobre os materiais sustentáveis que usam, os significados de estampas e de grafismos e a conexão com suas ancestralidades. Nesta nova reportagem, eu quis contar um pouco sobre a evolução do trabalho desses estilistas, à medida que ficaram mais conhecidos no cenário da moda nacional no último ano.
Amazônia Real – A reportagem foi publicada em janeiro de 2024 e os personagens estavam procurando a expansão de seus negócios e até mesmo apoiar outros empreendedores. Você tem acompanhado os personagens da matéria?
Nicoly – Acompanho e admiro o trabalho de todes, que continuam trilhando uma história inspiradora no universo da moda. Sioduhi, Yra Tikuna, We’e’ena Tikuna e Ateliê Derequine continuam produzindo peças que vestem, inclusive, outros artistas amazônidas. É possível perceber como está se criando uma identidade amazônida por meio da moda que esses estilistas produzem.
Amazônia Real – Você chegou na redação da Amazônia Real como estagiária e hoje é repórter graduada em Jornalismo pela Ufam. Naquela época inicial, o que lhe chamava atenção no jornalismo investigativo, socioambiental e que defende a Amazônia?
Nicoly – Me chamava atenção a possibilidade de poder colaborar com as fontes, para ajudar a contar essas histórias que elas querem contar. Muitas vezes são histórias de denúncias, que perpassam conflitos violentos e que envolvem a vida inteira de uma fonte que é impactada por isso. Quando comecei como estagiária na Amazônia Real, a luta da Kátia Brasil e da Elaíze Farias pelo jornalismo investigativo em defesa da Amazônia, dos povos indígenas e das questões de gênero, despertou em mim paixão e coragem para seguir na profissão. Ter mulheres na liderança é uma grande inspiração nesse sentido.
Na Ufam não tem uma matéria específica de jornalismo socioambiental ou de jornalismo investigativo. É uma coisa que faz muita falta. Então, durante minha trajetória na faculdade eu fui tendo que descobrir, ir desbravando. A Amazônia Real foi uma das grandes inspirações nesse sentido, mesmo antes de eu começar a escrever peças jornalísticas. Já era um lugar que eu lia e me inspirava nos assuntos e pautas. Porque na faculdade, mesmo estando na Amazônia, não tínhamos contato com essas pautas se você não fosse atrás.
Amazônia Real – E hoje, como você descreve sua trajetória profissional?
Nicoly – Sou uma jovem repórter curiosa pelo mundo e pelas histórias que as pessoas querem me contar. Minha trajetória profissional até aqui ainda é curta, mas marcada pela coletividade e gentileza de muitas pessoas que me ajudaram a percorrer esse caminho. Me sinto honrada de poder ter a experiência de sentar e conversar com as fontes das minhas matérias, honrada de poder ouvir suas memórias. Hoje, eu pretendo continuar trabalhando para que as histórias amazônidas sejam relatadas em reportagens, sejam de denúncia ou de celebração.
Amazônia Real – Dentre as suas áreas de investigação, temos reportagens sobre direitos humanos, conflitos em territórios e questões ambientais. Você tem enfrentado desafios nas coberturas? Se sim, quais?
Nicoly – Estar nas coberturas em campo em Manaus tem sido desafiador por causa da crise climática. O maior problema é o calor extremo que passamos, que queima mesmo a pele. E tem também a fumaça que encobre o céu da cidade, e nas coberturas é comum que a gente tenha que enfrentar. Outros desafios envolvem o assédio de assessores de imprensa, políticos ou até mesmo empresas, que pregam pela censura nas reportagens.
Amazônia Real – Outras reportagens suas têm abordado a luta de direitos pela comunidade LGBTQIAPN+. Como você percebe a cobertura na imprensa local sobre essa população?
Nicoly Ambrosio – Sou uma pessoa LGBTQIAPN+ e é natural que eu fale pelos direitos da comunidade em meu trabalho. Na imprensa local, percebo que a cobertura sobre as nossas narrativas é estigmatizada, muitas vezes preconceituosa e limitada. A mídia foca em casos de violência ou em datas comemorativas, sem abordar as lutas por inclusão e igualdade, as histórias reais. Falta também uma representação mais plural e respeitosa, que fale de pessoas trans, travestis, que são negras e indígenas, por exemplo. Uma representação que vá além das narrativas simplificadas, que dê destaque a diversidade e a complexidade das experiências LGBTQIAPN+ de Manaus, principalmente nas periferias da cidade. Muitas vezes, a própria comunidade precisa criar seus próprios espaços de voz e visibilidade, como é a cena Ballroom.
Desfile da Mostra Intercultural de Moda Indígena realizada em Manaus (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
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