Histórias de um povo que valoriza o sentimento comunitário
Moradores passaram muitas dificuldades, mas souberam lutar pelas melhorias
Uma cidade dentro de outra cidade.
É assim que muita gente define o Aero Rancho, um dos maiores núcleos populacionais de Mato Grosso do Sul. Não só por seu tamanho ou pela crescente população, mas por tudo que vem sendo conquistado nestes quase 40 anos de existência. O antigo bairro é hoje um polo microrregional, referência geográfica e socioeconômica na periferia da Capital de Mato Grosso do Sul.
Sem dúvida, a influência do Aero Rancho figura entre os fatores determinantes que aceleraram a expansão demográfica e a valorização imobiliária nesta região urbana de Campo Grande, a do Anhanduizinho. Fomentou o surgimento das dezenas de vilas e residenciais em seu entorno. Cada rua, cada calçada, cada casa e cada morador tem um perfil que encanta: espontaneidade, simplicidade, inteligência e um espírito combativo, que faz da comunidade uma das mais destacadas na história dos movimentos reivindicatórios da cidade.
A HISTÓRIA – Nabhan conta, de maneira resumida, os passos dados pelo bairro desde o início. “Estou aqui desde que era o Rancho do saudoso Lúdio Coelho. Naquela época só tinha galpões de peões com uma pista de aeronaves. O setor III foi construído em 1993 e os demais em seguida”, lembra. E continua: “Naquela época sofríamos com todos os problemas de um bairro sem infraestrutura. Só existia uma entrada. Uma alternativa era a pinguela sobre o Rio Anhanduizinho. Para passar tínhamos que pagar pedágio para pessoas que vinham de outros bairros”.
Em seguida, Nabhan fala sobre a organização das lutas. “Fundamos a associação de moradores. E como éramos carentes de tudo, começamos a reivindicar as devidas melhorias, principalmente asfalto e pontes. O barro e a poeira obrigaram muita gente a se mudar. Foi um bairro sofrido, mas com as nossas lutas comunitárias e a participação de todos os presidentes da região conquistamos melhorias”, assinala.
Jaílson Nabhan ressalta algumas conquistas obtidas pela comunidade: “Hoje temos o Hospital Regional, Hospital do Câncer, o Parque Airton Sena, um dos maiores do Estado. Temos banco, casa lotérica, ruas asfaltadas, um comércio forte. Nossos moradores não precisam se deslocar para outros centros. A segurança era um problemão em outras épocas, mas atualmente estamos mais tranquilos com o apoio das polícias Civil e Militar. Então, depois de muito trabalho, hoje temos um excelente bairro para se viver”!
DEPOIMENTOS
Percio Adão Pinheira, que chegou há mais de 30 anos no setor VI do Aero Rancho: “Aqui era um tormento, chovia até dentro de casa. E as casas eram para ser entregues com o asfalto, mas nos entregaram no pó e na lama. Naquela época fui assaltado, levei uma pancada e só ouvi os caras falarem para não levar a magrela por ser muito velha. Levaram um pouco de dinheiro e meu relógio, mas fiquei contente por não levarem a bicicleta que estava com dois quilos de carne na cestinha”.
“Depois a prefeitura asfaltou as ruas e nos cobrou muito caro, com um IPTU de valor exorbitante. Eu era bom de bola, joguei muito no Pirassununguense. Aqui em Campo Grande, em 1986, fomos jogar na Base Aérea. Levei tanta porrada que parei de jogar. Também com aqueles grandalhões, cheios de estrelas, como reclamar? Hoje aqui está muito bom, tenho muitos amigos”.
Ivo Mateus de Oliveira, chegou no Aero Rancho (setor V) no ano de 1990 e tem uma longa e produtiva militância comunitária, sobretudo no bairro. Montou com outras lideranças a comissão pró-quitação dos conjuntos habitacionais do CDHU Nacional. Foram até Brasília e junto aos membros do conselho curador do FGTS, deram o primeiro passo para quitar as casas da Cohab..
Sebastiana Diniz, seu marido Eliseu Ramos Custódio e a filha Elidiane mudaram para o Aero Rancho (setor VI) em 1990. No bairro nasceram mais duas filhas, Suelem e Suyane. E Sebastiana narra a luta contra as dificuldades: “Passamos um sufoco nos primeiros anos com todos os problemas existentes aqui. Mas agora, graças a Deus, já estamos estabilizados. A partir do ano 2000 montamos uma mercearia com o nome da filha caçula, Suyane. Duas filhas já se casaram. Não saímos daqui por nada”!
José Arantes de Souza, morador na região há 26 anos, é presidente do Jardim das Hortências I. “Estamos conseguindo reformar e aparelhar a praça, com equipamentos e estruturas como a pista de caminhada e o parque infantil já concluídos. Estão faltando ainda a quadra, a academia, a área cultural multiuso e a iluminação. Estão faltando também, pela Agetran, sinalização e os quebra-molas, já solicitados e encaminhados. Estamos sempre buscando melhorias para o conforto da nossa população”
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Essa vocação comunitária é encontrada em cada aeroranchense. Basta circular pelas ruas e logo se encontra pessoas como Iracy Queiroz. Ela se mudou para o Aero Rancho em 1989, encarando o desafio de melhorar a qualidade de vida da sua família. Hoje, vencedora e tranquila, tem uma loja de roupas masculinas e femininas, é mãe de três filhos casados e cinco netos. E dá graças a Deus por essa riqueza humana: a família.
POEIRA E LAMA – Iracy conta que quando chegou o lugar “era só poeira e lama quando chovia” e “quase não dava pra sair de casa ou ir ao ponto de ônibus”. Lembra que encobria os pés com sacolas plásticas e levava sapatos, roupa e toalha numa mochila para trocar quando descia do ônibus. “Havia poucos ônibus, muitos encalhavam na lama e outros, superlotados, não paravam para pegar os passageiros. Isso dava até briga”, relata.
Ela recorda que também pagava pedágio para atravessar a pinguela, na travessia sobre o córrego. Esse exercício era obrigatório, mas tinha seus perigos. Além dos assaltos, o risco de acidentes era grande, pela precariedade da estreita e improvisada ponte de madeira. “Certa vez um ciclista caiu da pinguela e morreu afogado lá no córrego. E à noite tinha muita violência, saía até tiroteio”, lembra.
Porém, embora a violência não tenha acabado, até porque é um problema de todo o País, muita coisa no Aero Rancho mudou sensivelmente, graças principalmente às iniciativas e à mobilização da comunidade, analisa Iracy. Hoje o lugar é servido por unidades policiais, postos de saúde, pavimentação asfáltica, sinalização, escolas, praças e outros serviços e equipamentos de uso publico. “Graças a Deus, diferente de antes, hoje temos tranquilidade e estamos muito bem”!
A dona-de-casa Leda Gomes de Oliveira mora no Aero Rancho desde 1993. Época em que a região, segundo suas palavras, era uma calamidade: “Muito barro, não tinha pontes e a única entrada era pelo Parati. Tinha uma pinguela e para passar por ela cobravam pedágio. E era necessário por sacolinhas nos pés para andar por aqui, era muita lama e poça d´água”, diz Leda.
Mesmo com dificuldades, foi a primeira comerciante na região, montou uma mercearia e sacolão. E a vida melhorou bastante. Depois foi instrutora de manicures: “Consegui formar umas 500 profissionais e com isso constituíram suas famílias”, exulta. “Hoje estamos muito bem. Mas precisamos de outros benefícios, inclusive as melhorias do Parque Ayrton Senna, como a reforma da piscina, que precisa acontecer o mais rápido possível, principalmente para nós que somos da melhor idade”.