CASO LEGIÃO URBANA: ESPECIALISTA COMENTA SOBRE A POLÊMICA BATALHA JUDICIAL
A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deverá decidir se os músicos Dado Villa Lobos e Marcelo Bonfá – que integraram a formação original da Legião Urbana – podem usar o nome de sua ex-banda sem autorização de Giuliano Manfredini, filho de Renato Russo.
O julgamento foi interrompido após pedido de vista por parte do ministro Antonio Carlos Ferreira, em 6 de abril, e ainda não tem data certa para ser retomado.
Mas, em um determinado momento, a banda precisou rever o direito de usar o nome no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), sendo utilizado então o nome da empresa registrada pelo então vocalista, Renato Russo, chamada de Legião Urbana Produções Artísticas Ltda, hoje em posse do herdeiro do cantor.
Todos os lucros eram divididos igualmente entre os integrantes, mas a banda ficou oficialmente registrada pelo cantor, falecido em 1996, aos 36 anos.
Em 2000, a marca Legião Urbana passou para a empresa herdada pelo filho de Renato Russo, após um pedido de registro ser deferido pelo INPI. Mais de dez anos depois, Dado e Bonfá foram à Justiça pedir o reconhecimento da co-titularidade sobre a marca e a disputa na Justiça ocorre até hoje.
ADVOGADO OPINA SOBRE CASO DA LEGIÃO URBANA
Marcelo Godke, advogado especialista em Direito Empresarial e Societário, professor do Insper e da Faap e sócio do Godke Advogados, explica que o monopólio do uso da marca é de quem registra e que a exceção a essa regra geral é se alguém já utilizava a marca anteriormente.
“Como os dois músicos já usavam o nome Legião Urbana antes do registro, eu vejo que há uma chance muito grande de eles conseguirem continuar utilizando essa marca, mesmo que a outra empresa, que é do filho do Renato Russo, possua o registro e o monopólio. Neste caso, o monopólio existe em relação a todos os terceiros, com exceção dos dois músicos, pois eles já usavam essa marca e podem continuar utilizando”, explica o advogado.
RENATO RUSSO: PORTADOR DO HIV, VÍTIMA DA AIDS
Voz inconfundível da Legião Urbana, Renato Russo soube em 1990 que era soropositivo (portador do vírus HIV, o causador da Aids), após o breve relacionamento com o norte-americano Robert Scott Hickmon, que ele conheceu em Nova York e chegou a morar junto no Brasil.
Segundo amigos, o fundador da Legião Urbana sabia que o ex-namorado de Scott estava morrendo devido à Aids. “Foi fogo. O namorado do Scott estava em estado terminal de Aids e mesmo assim o Renato Russo se envolveu com ele”, relembrou Leonice de Araújo Coimbra, a Léo, que testemunhou o início do relacionamento, em entrevista à revista ‘Isto É Gente’, em março de 2000.
Léo ainda diz que Renato Russo tinha certeza de que tinha pegado o vírus de Scott, que, segundo ela, “foi embora e ninguém soube mais dele”. Abalado com o resultado do exame, o cantor decidiu manter a informação em segredo dos familiares.
Nem mesmo a mãe de Renato Russo, conhecida como dona Carminha, sabia que o filho havia sido diagnosticado com a doença e só descobriu a verdadeira causa da morte por meio do noticiário na TV.
“À noite, ouvi na tevê: ‘Morreu hoje de Aids o cantor Renato Russo’. Foi um choque. De manhã, declarei que meu filho tinha morrido de anorexia nervosa”, relembrou Dona Carminha, em entrevista à mesma edição da ‘Isto É Gente’.
A magreza do filho era causada pelo transtorno alimentar, que fez parte de um processo de depressão profunda, que acometeu o cantor após a confirmação do diagnóstico de Aids.
A DEPRESSÃO E OS ÚLTIMOS DIAS DE RENATO RUSSO
Em janeiro daquele ano, Renato Russo chegou a dizer a amigos, de acordo com a ‘Veja’, que se imaginava chegando aos 50 anos e escrevendo o livro dele. Em julho, o cantor anunciou que queria descansar após terminar de gravar ‘A Tempestade’.
Três meses antes de morrer, ele tinha se isolado do mundo e se trancado no apartamento em Ipanema, no Rio de Janeiro. Foi então que ele passou a se recusar a comer, andar e até a falar.
Dois meses antes daquele 11 de outubro, o ‘Trovador Solitário’ teria dito: “A morte está perto e quero aproveitar ao máximo este momento para aprender com a própria vida e com a morte”. Um mês antes, ele descreveu como se sentia ao tomar o coquetel anti-HIV: “É como se tivesse comendo um cachorro vivo. E o cachorro me come por dentro”.
Três dias antes da morte, um boato: Renato Russo teria tirado a própria vida. A hipótese assustou Dado Villa-Lobos, guitarrista na Legião Urbana, que correu até o apartamento do cantor para ver se estava tudo bem – dentro do possível.
Sem comer, Renato Russo mal conseguia andar e apenas chorou abraçado a Dado, segundo Fernanda Villa-Lobos contou em entrevista ao jornal ‘Folha de S. Paulo’, no dia seguinte à morte do cantor. “Os dois choraram muito tempo abraçados. Dado ficou arrasado. Ele não sabia como ajudar o amigo”, explicou ela.
Dez dias depois da morte de Renato Russo, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá anunciaram o fim da Legião Urbana. Nove meses depois, o oitavo e último álbum da banda – e o primeiro póstumo com o cantor – foi lançado.
‘Uma Outra Estação’ contava com faixas gravadas durante as sessões para ‘A Tempestade’, que deveriam fazer parte do álbum, mas acabaram ficando de fora devido a decisões comerciais.
A Legião Urbana entrou para a história do rock brasileiro como uma das grandes bandas e se mantém viva também para além da cena musical: no campo judicial.
A disputa jurídica pela marca Legião Urbana se deu entre a empresa Legião Urbana Produções Artísticas, de propriedade do filho único de Renato, Giuliano Manfredini, e os dois integrantes, Dado e Bonfá.
Eles saíram em turnê em 2015 com o projeto Legião Urbana XXX Anos e, depois, passaram a fazer shows com o repertório dos discos ‘Dois’ e ‘Que País É Este?’.
Após idas e vindas, a Justiça decidiu, em novembro de 2018, que os dois poderão usar o nome em turnês, mas deverão pagar à produtora um terço do que faturarem.
Ainda cabe recurso e a decisão sobre a marca Legião Urbana está pendente para ser analisada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Enquanto isso, o legado musical de Renato Russo mantém a Legião Urbana lembrada e ouvida entre os brasileiros – vide números do Spotify, que, em janeiro de 2019, apontavam 2,6 milhões de ouvintes mensais.